Segundo executivos dos principais jornais do País, 90% da receita ainda vem do impresso
O saldo do encontro de profissionais de jornais no seminário promovido pela International Newsmedia Marketing Association (Inma), encerrado ontem em São Paulo, é um alerta: a tentativa de se achar a melhor maneira de incorporar as novas mídias digitais ao negócio não deve provocar o abandono da versão impressa. A razão é simples: 90% do faturamento das empresas jornalísticas ainda vêm do papel.
Três dos quatro executivos dos maiores veículos da área – Ricardo Gandour, diretor de conteúdo do Grupo Estado, Sérgio D’Ávila, editor executivo da Folha de S.Paulo e Paulo Motta, editor executivo de produção de O Globo – bateram na mesma tecla. Para eles, apesar do momento de transição vivido com o crescimento do número de leitores no canal online, não se pode deixar de lado a relevância da versão impressa.
“Há uma obviedade na qual todos nós desembocamos”, disse Ricardo Gandour. “Conteúdo de qualidade é o que faz os leitores buscarem o meio jornal para se informarem. Talvez, no futuro, o faturamento das empresas do setor não seja tão robusto quanto nos tempos em que os serviços analógicos predominavam. Mas a rentabilidade pode até ser maior, porque as condições serão outras, com gastos menores de distribuição.”
O diretor do Grupo Estado recorreu à evolução das mídias para lembrar que, sempre que um novo meio surge, há um abalo nos canais existentes e um período natural de deslumbramento com a novidade que aporta no mercado. “Ainda não encontramos uma plataforma de aceitação estável para amparar as necessidades de consumo e as de comercialização no meio digital. Mas, quando esse novo canal se sedimentar, o que vai prevalecer é o conteúdo”, disse.
Por isso mesmo, Paulo Motta não deixou por menos e brincou com as previsões catastróficas dos consultores que anunciaram a morte do jornal impresso em dez anos. Lembrou que o período já passou e o papel continua relevante. “A receita que vem do site é ainda 4% do faturamento do jornal impresso”, ressaltou. “Não dá para correr atrás do canto da sereia do digital, que é muito forte, e, com isso, matar a galinha dos ovos de ouro desse negócio. Há muitas oportunidades no impresso e acho que não estamos investindo nelas.”
Sérgio D’Ávila reforçou essas interpretações do atual momento da atividade ao apresentar uma ampla pesquisa de hábitos de consumo realizada em abril deste ano pelo instituto Datafolha. Entre os números relevantes, está o de que 52% da população que consome notícias se informa lendo jornais. Um índice que sobe ainda mais nas classes A, B e C, chegando a 66%. O meio jornal perde apenas para a TV, que é onde 90% se informam.
O dado mais animador para os profissionais do setor é a constatação da pesquisa que 73 milhões de pessoas dizem ler jornal impresso no Brasil, sendo que 21 milhões leem todos os dias. “O papel tem mais penetração do que a internet, que atinge 44 milhões de leitores de notícias”, disse.
Laboratório
Marta Gleich, diretora de internet do grupo de mídia gaúcho Zero Hora, fez parte desse painel de debate, que tinha a missão de mostrar como vai a harmonização das estratégias impressas e digitais. Logo de cara, não escondeu que experimenta a vida digital há apenas quatro anos, mas que fez toda a sua carreira no impresso. Dito isso, salientou que “não está no DNA das redações de jornais ou nos departamentos comerciais saber lidar com demandas virtuais. Precisamos incorporar a tecnologia ao nosso cotidiano”.
Diante dessa dificuldade em se desvendar o novo mundo, a executiva apresentou a experiência do grupo gaúcho de manter uma unidade de pesquisa tecnológica dentro do centro universitário da PUC, no parque tecnológico denominado Tecnopuc, em Porto Alegre.
“Ocupamos todo o 5.º andar, onde 85 profissionais de diferentes perfis – temos engenheiros, matemáticos e designers, entre outros – trabalham num ambiente ‘meio Google’, em busca de ferramentas e soluções para o jornal implantar no site, nas versões para celulares, assim como aplicativos e até games.Reconhecendo sua dificuldades em lidar com a flexibilidade e informalidade desse novo ambiente, ela considera que “pesquisa e inovação” viraram o centro do negócio da comunicação e precisam ser incorporadas às redações. “Não basta as empresas de comunicação parecerem digitais. Elas têm de ser digitais.”
Jornal O Estado de SP